17/12/2018 17:58
Em um sistema com 49 milhões de estudantes, baixo aprendizado e 2,7 milhões de crianças e jovens fora da escola, é urgente ressaltar que os maiores desafios da educação não incluem supostas doutrinação política e sexualização precoce, como defende o presidente eleito, Jair Bolsonaro. As repercussões dessa agenda, entretanto, representam riscos a uma educação de qualidade no Brasil.
Braço legislativo dessa ideologia conservadora, o projeto de lei chamado de Escola sem Partido não prosperou na Câmara em 2018, mas deve voltar à pauta do Congresso em 2019. Questionamentos já estão no STF. Decisões judiciais de várias instâncias e até liminar do próprio Supremo indicam ilegalidade no projeto por ferir a Constituição.
A iniciativa buscava limitar o que o professor fala nas aulas. Vetava ainda abordagens de questões de gênero e educação sexual na escola. Mesmo sem lei, episódios recentes de ameaças a professores, perseguições e censura de livros mostram que o debate na sociedade será ainda mais importante que o trâmite legislativo.
Parte da mobilização social se deve à construção de um pânico moral ancorado na ideia de que alunos estão ameaçados. O próprio Bolsonaro catapultou sua carreira nessa temática e, recorrentemente, mostrou um livro que seria sobre sexo para crianças, mas que nunca chegou às escolas por vias oficiais.
Na esteira desse discurso, especialistas temem o enfraquecimento da escola laica, o aumento de violência contra jovens homossexuais e os revisionismos históricos em livros didáticos. Concluem que o clima de autocensura vai piorar a qualidade da educação.
Uma preocupação central é que esse discurso moral, de raízes religiosas, e a luta quixotesca contra a suposta dominação do marxismo entre professores se sobreponham aos verdadeiros desafios educacionais do país.
Conceder centralidade a essa agenda afasta a educação de um dos mais emblemáticos desses obstáculos: o enfrentamento das desigualdades.
Nosso sistema não garante que todas as crianças e todos os jovens acessem a escola, permaneçam nela até o fim da educação básica e aprendam –o que cerceia os direitos e trava o desenvolvimento do país. Esses problemas impactam mais fortemente as famílias pobres e as populações negra e indígena.
Fonte: Folha de S. Paulo
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