NOTICIA

Novas alterações do FIES e os riscos imediatos e de médio prazo às ICES

02/02/2018 14:29

Desde o primeiro semestre de 2015 diversos questionamentos têm surgido sobre a retidão da gestão do Fundo de Financiamento da Educação – FIES, regulamentado pela Lei n.º 10.260, de 2001, assim como sobre a sua sustentabilidade. Há motivos para tanto, pois desde então houve a edição de medidas legais e administrativas unilaterais que tiveram deliberadamente a finalidade de alterar o equilíbrio econômico?financeiro em relação às Instituições de Ensino Superior contratadas, sempre de modo unilateral, ora em decorrência de medidas adotadas pela União, ora em decorrência da gestão do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). É possível citar:
1. A limitação de reajustamento de valores de mensalidades dos cursos acima do índice de 6,41%, durante o ano de 2015, e a vedação de cobrança de diferenças dos estudantes;
2. A retenção de valores devidos, independentemente da efetiva prestação de serviços, pela atribuição da classificação “contratos preliminares” àquelas IES que não tivessem seguido as imposições descritas no item 1;
3. Edição da Medida Provisória n.º 741, de 2016, convertida na Lei n.º 13.366, de 2016, que alterou o art. 1º, § 6º, da Lei n.º 10.260, de 2001, impondo o custeio dos encargos bancários às Universidades, alcançando 2% dos encargos educacionais liberados;
4. A informação, pelo MEC, de que os agentes financeiros devidamente contratados e remunerados decidiram unilateralmente não realizar a cobrança de contratos inadimplidos em valores inferiores a R$50.000,00, aumentando o risco atuarial do FIES;
5. A vedação de cobrança pelas IES de valores inadimplidos por seus alunos FIES sob o falho argumento de que tal cobrança não poderia ser realizada por agente particular. Na prática, isso já ocorre, uma vez que a gestão da dívida migrou para bancos que embora oficiais ostentam personalidade jurídica privada;
6. A publicação da Lei n° 13.530, de 2017, trouxe modificações como:
a. FIES nas modalidades 1, 2 e 3;
b. Novos agentes financeiros a atuar no FIES;
c. Condicionamento da oferta de FIES ao FG?FIES, na forma do art. 6°?G, da Lei nº 10.260, de 2001;
d. Aportes pelas IES ao FG?FIES em percentuais no primeiro ano de 13% e nos anos seguintes de 10% a 25%, variáveis em função da evasão, do não pagamento de coparticipação e outros valores devidos pelos estudantes, na forma do regulamento;
e. O reajuste das mensalidades FIES por índice oficial adotado pelo CG?FIES, alterando o §15, do art. 3º, da Lei n.º 10.260, de 2001.

Compreendida a evolução histórica é preciso estabelecer premissas para compreensão da tese que se destacará nesse artigo. O FIES só pode ser executado se forem estabelecidos dois contratos: 
1. O primeiro é um “contrato público e de adesão”, tendo como contratante a União e como contratados as IES e os alunos; 
2. O segundo é um “contrato acessório e de cunho privado”, firmado diretamente entre a IES e os estudantes e que comprova a prestação de serviços educacionais.

A afirmação tanto se faz correta que a contratação de natureza pública com o FIES ocorre por regulamentação do MEC, operacionalização do FNDE e com observâncias das regras expedidas pela Administração Pública Federal, inclusive no que toca à homologação pelos agentes financeiros que atuam no programa.

O problema estabelecido é que a Lei nº 10.260, de 2001, ao passo que estabeleceu regramento especial e diverso da Lei geral de contratação com a Administração Pública, notadamente a Lei de Licitações, por “omissão deliberada”, não estabeleceu quaisquer limites à atuação do Ente Público ou qualquer limitação de comportamentos públicos que impliquem prejuízos ao particular. Assim, ao que tudo indica, o MEC se baseia nas alterações impostas pela Lei n° 13.530, de 2017, para repassar custos aos particulares e aumentar seus riscos na operação sob a premissa implícita de haver uma “irresponsabilidade estatal” nessa matéria, aproximando?se temerariamente da ultrapassada doutrina “the king can do no wrong”.

A solução impõe a observância de um instituto de direito material, “o fato do príncipe”, e de outro lado um instituto de direito processual, “o mandado de injunção”. A descrição desse pensamento materializa uma possível estratégia de enfrentamento jurídico do caso:
1. Fato do Príncipe: A doutrina de Marcelo Alexandrino é clara em defini?la como: “... é toda determinação estatal geral, imprevisível e inevitável que impeça ou, o que é mais comum, onere substancialmente a execução do contrato, autorizando sua revisão, ou mesmo sua rescisão na hipótese de tornar?se impossível o seu cumprimento. O fato do príncipe encontra?se expressamente mencionado (embora não definido), no art. 65, II, d, da Lei 8.666/1993, como situação ensejadora da revisão contratual, por acordo entre as partes, para garantir a manutenção do equilíbrio econômico?financeiro do contrato.”;
2. Mandado de Injunção: Não há omissão constitucional na regulamentação da responsabilidade estatal na forma do item 1, uma vez que positivado expressamente na Constituição da República no seu art. 37, XXI. Ocorre, no entanto, omissão do legislador ordinário na regulamentação do dispositivo constitucional, ao ter estabelecido na lei do FIES um sistema de irresponsabilidade pública em prejuízo dos particulares. A Lei n° 8.666, de 1993, trata explicitamente da matéria no art. 57, § 1º, entre outros artigos da norma. A Lei n° 10.260, de 2001, calou?se.

Há casos precedentes de omissões legislativas sérias, como a que trata do direito de greve dos servidores públicos, que deu azo ao ajuizamento dos MI nº 670, 708 e 912 e que diante da inércia do Congresso Nacional em cumprir seu dever culminou na determinação, diretamente pelo Poder Judiciário, da aplicação da Lei n.º 7.783, de 1989, que regulamenta o mesmo direito quando vinculado ao setor privado. No caso em discussão, tudo faz crer que seria o caso de se estender os dispositivos da Lei nº 8.666, de 1993, que tratam da matéria, até que a omissão legal seja suprida.

Essa publicação também se preocupa com o aspecto mais urgente da demanda, pois uma vez que o prazo de adesão ao novo FIES tem termo em meado de janeiro, o que se deve fazer? Prementes os prejuízos financeiros que possam ocorrer caso na se faça a adesão e estando o SISFIES configurado de modo a não aceitar quaisquer discordâncias, deve?se notificar a União e o FNDE sobre a discordância irretratável em relação aos itens que criem desequilíbrio econômico?financeiro às IES e, ato seguinte, judicializar a matéria. Assim, não se poderia falar em concordância tácita ou mesmo preclusão para discussão de eventuais prejuízos e se afastaria sérios problemas de operacionalização do sistema no curto prazo.

Não se deixa de ressaltar que há dispositivos da legislação que merecem enfretamento específico, como é o caso do art. 4º, §§ 9º, 10 e 11, da Lei nº 10.260, de 2001, pois ao determinar que os contratos e aditamentos concedidos até o último semestre de 2017, só serão mantidos se a IES aderir ao FG?FIES na forma do art. 6º?G, a lei buscar alterar regras esculpidas em contrato que se perfectibilizou sob regime jurídico pretérito e que, desse modo, não pode mais ser atingido por alterações desse regime, ainda que o contrato tenha seus efeitos projetados para o futuro. Essa proteção contra a retroatividade da lei consta como garantia constitucional no art. 5º, inciso XXXVI, da Carta Magna, e também na LINDB, em seu art. 6º.

Outro ponto interessante diz respeito a aplicabilidade do art. 4º, § 1º?A e § 4º, da Lei nº 10.260, de 2001, e dos arts. 1º e 2º, da Resolução nº 3, de 13/12/2017, que ao estabelecer os descontos regulares e de caráter coletivo enumera apenas aqueles deferidos aos professores e seus dependentes, em razão de convenção coletiva de trabalho, mas deixam de citar os demais funcionários. Independentemente da ocupação deles, se professores ou do corpo administrativo por exemplo, o nome “desconto” não altera sua natureza jurídica, haja vista que materialmente tratam?se apenas de “direitos trabalhistas” a que a IES está dando cumprimento. Assim, sua exclusão do quadro total de descontos é desnecessária, mas se realizada ocorre apenas para aumentar a segurança jurídica e de modo exemplificativo. Em razão da falha aventada, a judicialização é também nessa hipótese o caminho para evitar discussões futuras.

Por fim, a alteração proposta no art. 4º, § 1º?A e § 15, da Lei nº 10.260, de 2001, assim como pelo art. 1º, da Resolução nº 11, de 13/12/2017, que busca afastar a aplicabilidade da Lei nº 9.870, de 1999, em relação ao aluno FIES para que os valores dos serviços educacionais vinculados ao FIES sejam reajustados unilateralmente pelo Poder Público mediante decisão do CG?FIES independentemente dos custos reais envolvidos apenas reforça os argumentos iniciais desse artigo sobre a total despreocupação da União com qualquer equilíbrio econômico?financeiro das entidades envolvidas, uma vez que está seguro o Ente Público de sua irresponsabilidade por quaisquer prejuízos que cause, o que é um engodo jogar o peso de toda ineficiência da máquina pública na gestão do FIES nos anos anteriores sobre as Universidades, Centros?Universitários e Faculdades e, antes mesmo de ser ilegal, inconstitucional.

A União deve enfrentar as consequências de suas ações, deve ser posta na condição de ré junto ao Poder Judiciário e aí, em relação equitativa à das IES contratadas, responder por seu comportamento reiteradamente abusivo.

Dyogo Patriota

Assessor Jurídico da ABRUC

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