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OPINIÃO: Educação, a única saída

27/04/2018 17:57

Muito se discute sobre qual reforma, dentre as tantas necessárias no Brasil atual, o próximo presidente irá priorizar após tomar posse, em janeiro de 2019. Como se sabe, os primeiros cem dias de um governo são preciosos - um momento crucial para se emplacar grandes mudanças estruturais que poderão ditar os rumos do país não só durante o novo mandato, mas também nas próximas décadas.


No páreo, concorrendo ao primeiro lugar em termos de importância, está a reforma política, pela gritante necessidade de substituir o nosso sistema político por um que funcione e beneficie a entrada de gente boa na política, gente compromissada com os objetivos da sociedade e não com os próprios interesses. Emparelhada, está a reforma da previdência, pela urgência inequívoca do equilíbrio das contas públicas. A reforma tributária, com potencial para transformar o Brasil num país mais competitivo e turbinar o progresso, vem logo atrás.


Mas qual é a reforma-mãe? A que colocará, de fato, o Brasil em outro patamar de desenvolvimento e de inserção no mundo? Para mim, só há uma resposta: a reforma educacional. Estamos num ponto que, se não encararmos de frente o problema da educação, vamos parar no tempo. Como nos mostra a história, não há país que tenha saído de um ciclo vicioso de pobreza, corrupção e violência para outro, virtuoso, de desenvolvimento, igualdade e justiça social, sem investir em capital humano, ou seja, sem oferecer ao seu povo uma educação qualificada e digna. Temos falhado muito nesse sentido.


Desde os anos 90, nossa política educacional tem o mérito do aumento no número de vagas nas escolas. Mas não oferecemos um bom ensino. Nossos índices são sofríveis. Segundo a Avaliação Nacional da Alfabetização, 55% dos alunos até o 3º ano do Ensino Fundamental não estão aptos a ler, escrever e interpretar estruturas simples. Ou seja: crianças de 9 anos não sabem responder que um porco é um porco ao olharem para uma figura de um porco. Simples e assustador assim.


Quase metade dos estudantes apresenta nível de aprendizagem abaixo do adequado, de acordo com o Pisa, condição que não se restringe aos oriundos de famílias mais humildes. Os alunos com melhor nível socioeconômico apresentam desempenho inferior ao dos mais pobres de Macau e Vietnã. Estes dados, chocantes, são reflexo do modelo de ensino atual. E um descaso com o aprendizado dos alunos.


Algumas condições tornam a nossa educação uma das mais atrasadas do mundo. Uma delas é o mau uso do dinheiro público, fazendo com que boa parte dos 5% do PIB destinados à Educação Básica, R$ 330 bilhões, não sejam utilizados para aquilo que faz a diferença na aprendizagem: formação de professores, material didático de qualidade e definição de um currículo que faça sentido para o jovem.


O excesso de burocracia, por sua vez, sobrecarrega a administração pública, aniquila a produtividade e prejudica a própria educação, nos prendendo a um looping de retrocesso do qual precisamos urgentemente escapar. Enfim, criamos, ao longo do tempo, um sistema educacional que está mais preocupado em manter a máquina funcionando, muitas vezes para beneficiar esse próprio sistema, do que comprometido com o quanto os alunos aprendem e de que forma aprendem melhor.


Eu, assim como especialistas na área, acredito que esta é a última chance que temos para colocar a educação em primeiro lugar no nosso país. Para isso, precisamos desenhar um plano estratégico para a educação brasileira. Um plano com etapas e passos bem definidos, não só na implementação, mas também na continuidade. Um plano desses, ambicioso, deve contemplar um horizonte de pelo menos três mandatos. Estudos do movimento Todos Pela Educação mostram que é possível mudar a cara da nossa educação em doze anos.


Este plano necessita de ingredientes nada misteriosos ou milagrosos. Para começar, a erradicação do analfabetismo. Com um projeto bem arquitetado e afinco, isso é muito possível de fazer, respeitando inclusive as diferentes realidades do Brasil. Um projeto para a valorização para valer do professor, o profissional mais importante de um país, já que os docentes formam 100% das futuras gerações. Ele deve dar conta de subir a régua para o ingresso na profissão e de atrair gente mais qualificada para a área, além de mirar uma formação inicial com um currículo moderno, focado nas didáticas de sala de aula e nas habilidades socioemocionais, e um plano de carreira que proporcione uma evolução atrelada à capacidade de fazer os alunos aprenderem e o desenvolvimento contínuo.


Uma política nacional para a Primeira Infância, já que esta etapa é, comprovadamente, a que mais faz a diferença para o sucesso de uma pessoa, também se faz necessária. Por fim, o governo central deve assumir o papel, importantíssimo, de coordenar a ação de quem executa a educação na ponta, que são os Estados e municípios, dando os incentivos certos e fiscalizando a implementação das diretrizes para que todas as crianças do Brasil tenham acesso a um ensino de qualidade e as mesmas oportunidades de serem bemsucedidas.


A exemplo do Chile e da Coreia do Sul, que conseguiram elevar a qualidade do ensino a ponto de impactar positivamente o desenvolvimento econômico, o Brasil deveria ter a educação no centro de suas reformas. Com os devidos esforços, em 20 anos esses dois países aumentaram a produtividade do trabalhador e hoje trilham um caminho mais próspero. No Brasil, todo o lavor das últimas três décadas em torno da educação - incluindo o aumento significativo da oferta de vagas e do nível de escolaridade da população - parece ter sido inócuo. Nossa produtividade permanece estagnada em sua "soneca de 50 anos", como colocou a revista britânica The Economist.


Para que possamos mudar o curso da nossa história e, enfim, acordar do torpor que nos imobiliza e nos impede de evoluir como nação, não basta a crença, ainda que generalizada, de que sem educação não há progresso. Nem são suficientes o comprometimento e o empenho dos políticos que virão a assumir a direção do país, em janeiro, com a implementação de medidas para elevar a qualidade do nosso ensino. É preciso também coragem para encarar nossas fraquezas de frente, detectar onde erramos nesse processo sem titubear e, a partir daí, iniciarmos uma transformação profunda e significativa do sistema educacional, uma mudança que esteja realmente alinhada com o projeto de país que pretendemos ser.


Fonte: Valor Econômico

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