16/04/2018 18:00
No início do século XX, Simone de Beauvoir, filósofa, escritora e professora, refletiu sobre uma questão à primeira vista simples: o que significou para mim ser mulher? Ela relata, em A força das coisas, que pensou poderia responder a essa pergunta rapidamente, “para mim essa questão nunca contou”. No entanto, ponderou: “Olhei mais de perto e foi uma revelação: esse mundo era um mundo masculino, minha infância foi constituída de mitos masculinos e eu não reagi, de forma alguma, da mesma maneira como se eu fosse um menino”.
Daí a frase: “Não se nasce mulher: torna-se mulher”. Na data de morte de Beauvoir, dia 14 de abril de 1986, relembrar seu legado é refletir sobre as diferenças entre mulheres e homens quanto às responsabilidades que lhes foram atribuídas, às atividades realizadas, ao acesso e ao controle dos recursos, bem como às oportunidades de tomada de decisões.
Ainda hoje, mundialmente, nascer menina significa estar mais propensa a nunca colocar os pés em uma sala de aula: há 34 milhões de meninas fora da escola primária no mundo, do total de 63 milhões de crianças. Somente 35% das meninas seguem carreira no campo de exatas na Educação Superior, de acordo com o relatório Unesco “Cracking the code” (2017). No Brasil, 26,1% das meninas que não estudam deixaram a escola para realizar afazeres domésticos ou cuidar de pessoas, conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) (2016); outros estudos apontam também a gravidez como importante causa da evasão escolar de mulheres jovens.
A preocupação não é apenas em relação às meninas na escola ou fora dela, mas às consequências disso em suas vidas – por exemplo, elas são as maiores vítimas de violência sexual; e podem ter limitados os seus caminhos profissionais – conforme relatório do Fórum Econômico Mundial, elas representam somente 6% das diretoras-executivas no mundo. No Brasil, as mulheres ganham, em média, 25% menos do que os homens.
O Plano Nacional de Educação (PNE) prevê estratégias para superar essas questões. Na Meta 3, para universalizar o Ensino Médio, o Plano reconhece, na Estratégia 3.13, a necessidade de “implementar políticas de prevenção à evasão motivada por preconceito e discriminação racial, por orientação sexual ou identidade de gênero”. Na Meta 14, busca “estimular a participação das mulheres nos cursos de pós-graduação stricto sensu, em particular aqueles ligados às áreas de engenharia e matemática e outros campos das ciências”.
Abordagem abrangente e inclusiva da Educação
A Educação deve ser livre de qualquer discriminação para proporcionar as condições do pleno desenvolvimento. Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) adotados pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015, visam a eliminar a pobreza e promover a sustentabilidade. Para tanto, é essencial combater a desigualdade de gênero, conforme o ODS 5, relativo à igualdade de gênero. A questão deve ser vista de forma integrada. Assim, como estabelece o ODS 4, é primordial a oferta, para meninas e mulheres, de uma Educação de qualidade, inclusiva e equitativa.
É necessário implementar ações para desconstruir os estereótipos e remover as barreiras baseadas em gênero. A Unesco recomenda o desenvolvimento de currículos escolares inclusivos, que transformem impedimentos em oportunidades, além do estabelecimento de ambientes seguros, dentro e fora da escola, que favoreçam resultados de aprendizagem efetivos. A igualdade de gênero é uma prioridade global da Unesco, pois é fundamental para a promoção do respeito e da cidadania que, por sua vez, estão na base da construção da paz e do desenvolvimento sustentável. Por isso, devemos pensar na integração da abordagem sensível ao gênero em legislações e políticas, em todos os âmbitos, do mundial ao local, incluindo as escolas. Como a igualdade de gênero faz parte da Agenda 2030 e do PNE, nenhuma meta pode ser considerada alcançada a menos que seja alcançada por todas.
Estadão
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